17 de julho de 2007

UM VASO DE ROSAS




A escuridão ocultava sua passagem em frente ao jardim. Pensava ser uma simples penumbra sem ser percebida, perdida nas paredes, que o acompanhava em seus passos lentos. Casacão escuro, chapéu puxado que encobria os olhos, andar tolhido pelo peso que as pernas carregavam, fingia-se na miserabilidade para que ninguém levantasse suspeita no seu modo de viver. Desejava ser um ator de poucos momentos, como se o próprio tempo tivesse apagado o vigor de sua juventude. Lembrar o passado poderia trazer-lhe gratas recordações, mas não valia a pena revivê-lo, pois a saudade o martirizaria de tristeza. Mágoas provocariam lágrimas em seu rosto marcado de estrias profundas.
Parou em frente à casa, cujas janelas guardavam os mesmos contornos de velhos tempos, quando se abriam nas manhãs ensolaradas de esperanças de um novo dia As escadarias pareciam convidá-lo a subir até a porta de entrada e dar leves toques, como nos entardeceres da primavera. Ficou indeciso por instantes. Não ousou.
Por entre as frestas de um portão ao lado colhia sorrateiramente uma rosa, no frescor de seu desabrochar. Fazia parte diária de sua vida noturna. Na janela depositava a flor todas as noites, com uma mensagem cheia de carinho.
Certa madrugada e para sua surpresa, uma voz o convidou a entrar na casa. Sobre a mesa, um vaso com todas as rosas colhidas ao longo de muitas noites, com uma mensagem de agradecimento, escrita em linhas tortuosas como marcas deixadas pelos tempos, mas cheias de ternura. Uma cadeira vazia, um espelho estilhaçado, uma foto desbotada na parede, o dia despertando.
O sol chegando alto, penetrando forte na casa vazia. As rosas, secas.




Um comentário:

Anônimo disse...

Lindo!!! Lembrei-me das rosas de minha mãe... como ela as adorava!
Estou amando ler seus contos, Vico.qta saudades do Tamanadupá!!!
abrçs da prima Gatuzza