8 de setembro de 2007

O CIRCO


Uma das lembranças mais marcantes que a pessoa carrega dos tempos de criança é a do Circo. A expectativa pela presença do palhaço, a atração maior para seus desejos de sonhos e fantasias. O palhaço, com suas estripulias e brincadeiras ingênuas, que chora e faz rir. Nas arquibancadas de madeira, o menino ri, se encolhe, rói as unhas e, por fim, bate palmas, extravasando sua alegria. Na segunda-feira, quando o Circo vai embora fica triste. Que fazer! O que salva é que no ano que vem o Circo estará de volta.


OS NOVOS VIZINHOS


Nas mudanças de residências que as pessoas fazem na vida, normalmente variadas em números, sempre chamam a atenção as novas e futuras amizades. Conhecer é um despertar de expectativas, porque nunca se sabe o que pode acontecer, sobretudo, em se tratando da curiosidade que alimentam as novas vizinhas.
Já se sabe que as transferências de domicílios são feitas durante o dia e durante o dia os vizinhos estão trabalhando, cumprindo seus compromissos profissionais, ao passo que as vizinhas guardam um tempo para espionar a nova família que chega, enquanto cuidam, zelosamente, de suas tarefas domésticas.
Pois bem. Algumas vizinhas, discretas, preferem o silêncio, mas esticam olhares curiosos por detrás das janelas entreabertas. E se recolhem assim que a nova vizinha também as espia disfarçadamente.
Outras varrem as calçadas e batem papo, enquanto olham furtivamente em direção às
tralhas que são descarregadas. Nunca deixam de registrar alguns comentários dirigidos à vizinha que chega, sobre o penteado, os sapatos, o vestido, a pintura, se é simpática ou não.
Tem as que aparecem nas portas, com membros da família e, sem cerimônia, conversam em voz alta, chamando a atenção como que desejando puxar assunto com os que chegam.
As que regam o jardim e molham vasos ou chegam terra a um pé de rosa vão se aproximando e os recepcionam simpaticamente, desejando-lhes boas vindas, oferecem ajuda, ficam à disposição para qualquer pedido e não se furtam a convite para um café coado na hora, acompanhado de fatias de bolo. Chamam até as crianças para brincarem com os novos colegas.
Essa troca de olhares, no silêncio ou nas conversas discretas, está ligada aos primeiros contatos de um compromisso de amizade, íntima ou não, que será firmado num futuro imediato.
Depois de tudo isso, a formação de um novo círculo de amizade está relacionada ao comportamento a que se predispõem as famílias. Claro que ninguém aprecia aquele entra e sai em casa, principalmente quando da novela, do noticiário ou de um filme dos mais badalados. Tampouco o costume de se emprestar um ovo, uma colher de açúcar, uns pingos de óleo, uma xícara de trigo ou algo parecido.
Perdoados certos inconvenientes, não são poucas as famílias que preferem um contato bem discreto. Mantêm a amizade, se cumprimentam, conversam até animadamente, participam de reuniões, mas tudo na base do necessário, das obrigações do momento. Isso não é bom entre as pessoas extrovertidas, que apreciam bate-papos animados e encontros festivos. Tudo é levado em conta na convivência que será mantida a partir da chegada dos novos vizinhos.
Não duvido que essas observações tenham passadas desapercebidas de quem entra para um novo convívio social. É uma recepção curiosa, mas não deixa de ser uma saudação.

OS SANTOS REMÉDIOS


Sempre é bom ouvir comadres. Não apenas as que seguram os filhos em batizados, mas também aquelas que se fazem amigas em encontros casuais, provocados por viagens, passeios, ônibus ou parado em um canto qualquer, aguardando a chegada de um amigo. Ou, então, nessas barracas de artigos artesanais, bordados, rendados e outras utilidades muito apreciadas pelas donas de casa.
Nessas oportunidades, é só dispor de um tempo, que pode se alongar por horas, as conversas ganham uma extensão sem limites, porque se fala de tudo. Daí a pouco, até parece que os contatos sugerem uma amizade que vem de anos, ainda que isso não seja realidade. Se pessoas conhecidas que se reencontram então é um tal de matar saudade, rememorar fatos, procurar saber por onde anda uma amiga não vista há anos, se casou, se tem filhos, onde mora, dos tempos escolares, se fulana está viva ou não e assim por diante.
Duvido que isso não ocorra com todas as
pessoas.
Quando isso acontece, dificilmente deixa-se de contar um caso, um acontecimento, peraltices de filhos traquinas, uma doença, própria ou de alguém que se conhece. Parece que se encontram assuntos que dão pano para mangas e é um nunca mais acabar de receitas que se constituem em verdadeiros santos remédios.
Sabe-se que gente do interior se apóia em remédios caseiros, chás, emplastros, pomadas e outros preparados para resolver problemas de saúde. Não porque são apenas providências urgentes, como também pelo fato de que a procura de um médico nem sempre tem a rapidez necessária ou pode ficar para o dia seguinte. O que é preciso é resolver na hora uma dor lombar, de estômago, de cabeça, de barriga, contusão, um corte no dedo, um calo que atormenta, um olho de peixe ou outro incômodo qualquer. Para isso, a comadre está sempre ao lado, na vizinhança e o atendimento pode ser através de uma cerca, por cima do muro, em visita em casa. Quem morou em fazendas ou bairros rurais sabe muito bem como fazer isso. Claro que quando a coisa é séria dá-se um jeito para tudo, porque sempre se encontra um amigo por perto para resolver a situação.
Interessante que, nessas ocasiões, fica-se sabendo de tudo, descobrem-se os mais intrincados produtos para as soluções desejadas. Às vezes, plantas bem conhecidas, mas que não se sabia de seu uso para debelar doenças, são plantadas e oferecidas para que sejam cuidadas em casa e fiquem à disposição para qualquer emergência.
E quando a conversa parte para assuntos sentimentais? Um namoro mal compreendido, uma paixão frustrada ou uma traição inesperada? Não falta mesmo recomendação contra inveja, mau-olhado, olho gordo, ciúme ou outro motivo que esteja provocando aborrecimento à pessoa que espera um conselho. Nesse caso, valem muito "simpatias", feitas das mais variadas formas, para curas certas.
Claro que não vou adiantar aqui o nome de nenhuma planta que se transforma em remédio e que produz a cura de qualquer mal, porque essa não é a minha área. Eu gosto é de ouvir, registrar as conversas, os assuntos que dominam esses encontros amigos. Afinal de contas, o cronista vive disso e não pode perder oportunidades como essas, não é verdade? Então, ouço e escrevo. Isso não faz mal algum.